III


Defronte a platéia,
Olho o eu público:
Eu-pai, eu-marido, eu-amigo.
Todos, o meu rosto.
Eu-filho, eu-só, eu-passante.
Inspiro,
Expiro.
Duas pancadinhas da batuta,
As de praxe,
E seremos todos um,
Ou
Nenhum.
Barulho de

Microfonia, ou
Harmonia
de
Orquestra.

II


Fique imóvel
Reto
Respire
Não é você que respira
Embora respire
Algo respira em você
Algo
Visível no momento mais
Invisível
Entre o
Inspirar e o
Expirar
Tudo chama a
Atenção
Algo não
Respira em
Tudo
Chamando
Atenção
Invisível

I


Quem?
Ninguém.
Como?
Não sendo.
Quando?
Não existe o tempo.

Senhor do Silêncio


Alá
Adonai
Al-Malik
Anterior ao Nada
Anti-Matéria
Buraco Negro
Criador
Dono do Espaço
Deus
El Shaddai
Engenheiro do Universo
Fenda Abissal
Ferreiro da Matéria
Fio Invisível da Existência
Fogo que Consome
Fonte de Todo Conhecimento
Gudánaz
Hutá
Iavé
Jeová
Kadosh
Luz
Matéria Escura
Mecânico Quântico
Mestre do Tempo
Neuroquímico
Nomeador
O Princípio e o Fim
O Que Não Tem Nome
Posterior a Tudo
Quetzalcoatl
Rei dos Reis
Reverso do Espelho
Super-Nova
Trama da Ausência
Theos
Tzur Israel
Uasar
Vasu
Yod-Hei-Vav-Hei
Zênite.

Alusões ao que
Nomeia e não pode ser
Nomeado.
Dedos que apontam para a
Lua, não a
Lua.

Noite & Dia


Idade de

Preferir sair à
Sombra da
Luz do
Sol, e fugir da
Luz da lua que
Já me
Assombra.

Nada Sei


Quando alegre,
Tudo alegria.
Quando triste,
Tudo tristeza.
Meus olhos
Pintam o mundo.
Sem por que,
Nem porquê.

Mulheres II


Os passares,
As fendas,
Os olhares, das
Mulheres.
Encantos
Puros.

Mulheres


Meninas do Meira,
Rainhas da Rhodia,
Amantes do Aplicação.
Anos de amores.
A passada
Sedução.

Poesia


Poesia clara
Poesia escura
Poesia cálida
Poesia obscura

Poesia que toma partido
Poesia de luxo
Poesia pensada
Poesia súbita

Vento Ruim


Em algum momento da vida,
Chega um vento ruim.
Não vem de parte alguma,
Não é previsível ou
Esperado.
Mas transforma a vida.
De repente.
Mas ventos passam
E vão embora.
Até mesmo os ruins.

Ouvi Dizer


Parece que

Por uns anos
Aí, andou
Trocando de Olvido.

Comum


Viver nos dias
Comuns, e
Agir nos dias
Comuns, e
Encontrar pessoas
Comuns, nos
Dias.
Em todos eles,
Os gestos usuais, os
Afazeres programados, os
Pensares aleatórios.
A delicadeza no trato, o
Cumprir dos deveres esperados,
Os cumprimentares corteses,
O coexistir pacífico com os outros, em
Comum.
Mas por detrás,
De todos os olhares,
De todos os gestos,
E dos sorrisos todos e das
Cortesias e das obrigações todas,
Uma infinita e
Indefinível tristeza de existir.
Em todos.
Também esta, estranhamente,
Comum.

Ruas


Dêem-me
Três visitas de
Duas horas cada
Em dias salteados
A quaisquer ruas.
Faço amigos e
Ouço histórias para
Contar.
Puxo prosa,
Teço teias.
Sorvo o caldo
Pelas beiradas
Das calçadas.
E sinto o aroma das
Primeiras cidades.

Cinerário


Quando
Morrer e houvesse um meu
Funeral,
Bom seria que lá estivessem -
Não haverá, bem sei,
Cremado,
Virarei
Cinzas,
Coisa rápida,
Que o vento espalha.
Mas que estivessem todos,
Na inexistente reunião,
E vissem uns aos outros.
Os poucos, para quem tive
Nome e endereço.
Os outros muitos, conhecidos por acaso.
Nomes escritos na areia da praia, que o
Mar lava e leva.
Os choferes de táxi e os garçons,
Os ocasionais das várias vias da vida,
A molecada que deu trela à pretensa
Sabedoria de coroa,
Os improváveis habitantes de rua,
Os aristocratas de vernissages e lançamentos,
Os companheiros de guias e calçadas
Ás cinco da matina,
Eles já e eu ainda.
Os grandes amigos potenciais de uma só
Ocasião, nas diversas línguas e
Culturas de onde vieram para nos
Encontrarmos, sem que houvesse encontro marcado.
Os amores que poderiam ter sido,
Os que já se foram,
Os que,
Minusculamente,
As mágoas afastaram.
Todos enfim.
Agradar-me-ia que ouvissem
Amazing Grace, com gaita-de-foles em tarde de sol, e se
Possível, no pleno entardecer, também
We Shall Overcome, para os
Filhos meus,
Que os tive abundantes pela
Vida afora,
Deus me abençoe!
Ir-me embora
Como numa
Festa,
Como se ausente,
Merecesse afinal,
Um belo adeus, de
Todos que,
De uma forma ou de outra,
Em algum momento,
Comigo partilharam o caminho,
Amamos e
Fomos amados.

Logos


Logo logo
O que é
Falso
Falso
Se revela.

Calma Ebulição


Meus ancestrais não tinham tostão.
Elite quando a elite era de inteligência e espírito e
Não de dobrões ou escudos nesse rincão.
Cresci filho da cizânia entre os papas e Lutero, comendo

Em uma mesa na qual não havia assunto que não fosse assunto.
Escola de livre pensar.
Agora, eis me aqui,
Velho como quando achava velhos meus pais:
Cinquenta e poucos.
Como a Terêncio,
Tudo que é humano me concerne.
É minha legítima herança e maldição.
Disso teço minhas teias, meus poemas e meus pensares.
Malgré alguns dias por baixo do carpete, no geral,
Adoro estar vivo e cada casquinha da vida
Atrai o meu olhar,
Fascina minha atenção,
Apaixona minha alma.
Gosto - e sou parcial - com gente inteligente.
Lavar burros, como diz meu irmão,
É desperdício de água e sabão.
Mas, mesmo assim, ando mais gentil, mais paciente, mais

Disposto ao banquete que me apresenta o dia.
Com os burros todos, os toscos, os pobres de espírito,
Os ignorantes e outros tantos.

Atualmente aprendo com tudo e todos,
Deve ser a tal da sabedoria que vem com o tempo.
Calma ebulição.

No Túmulo de Meu Pai


Mais
Um ano se passou.
Terias noventa e um.
Quatorze da sua
Morte.
Mudanças muitas desde aquele ano,
Daquele século.
Novas antenas,
Velhas antenas.
Novas bobagens,
Velhas bobagens.
Sua cartilha,
Inalterada.
O que eram
Verdades,
Verdades.
E as mentiras,
Mentiras.

Passarinho


O de bom da vida
Consegue-se como se
Consegue a confiança de
Um passarinho.
Com paciência, com o
Coração puro, esquecido de
Si mesmo. E,
Com o saber que, às vezes,
Não se consegue.
E o sol, como que de acordo, nasce e
Põe-se todos os dias.

Assim


A morna mão no ombro,
O fino frio da faca.
Assim,
Vida e morte.