Cinerário
Quando
Morrer e houvesse um meu
Funeral,
Bom seria que lá estivessem -
Não haverá, bem sei,
Cremado,
Virarei
Cinzas,
Coisa rápida,
Que o vento espalha.
Mas que estivessem todos,
Na inexistente reunião,
E vissem uns aos outros.
Os poucos, para quem tive
Nome e endereço.
Os outros muitos, conhecidos por acaso.
Nomes escritos na areia da praia, que o
Mar lava e leva.
Os choferes de táxi e os garçons,
Os ocasionais das várias vias da vida,
A molecada que deu trela à pretensa
Sabedoria de coroa,
Os improváveis habitantes de rua,
Os aristocratas de vernissages e lançamentos,
Os companheiros de guias e calçadas
Ás cinco da matina,
Eles já e eu ainda.
Os grandes amigos potenciais de uma só
Ocasião, nas diversas línguas e
Culturas de onde vieram para nos
Encontrarmos, sem que houvesse encontro marcado.
Os amores que poderiam ter sido,
Os que já se foram,
Os que,
Minusculamente,
As mágoas afastaram.
Todos enfim.
Agradar-me-ia que ouvissem
Amazing Grace, com gaita-de-foles em tarde de sol, e se
Possível, no pleno entardecer, também
We Shall Overcome, para os
Filhos meus,
Que os tive abundantes pela
Vida afora,
Deus me abençoe!
Ir-me embora
Como numa
Festa,
Como se ausente,
Merecesse afinal,
Um belo adeus, de
Todos que,
De uma forma ou de outra,
Em algum momento,
Comigo partilharam o caminho,
Amamos e
Fomos amados.